domingo, 15 de janeiro de 2012

O socialismo soviético


O socialismo científico é uma doutrina política que se situa a esquerda do espectro político, fundamentando-se no pensamento filosófico de Karl Marx e de Friedrich Engels, e na sua interpretação realizada por Vladimir Lênin e demais revolucionários bolcheviques, que fizeram na Rússia, a primeira revolução socialista da história.

Segundo o pensamento marxista, a luta de classes é o motor que move a história, ou seja, a luta das classes dominadas contra as classes dominantes resulta em uma revolução social, promovendo a mudança dos meios de produção e assim gerando uma nova sociedade. Na atual sociedade capitalista, a luta de classes do proletariado contra a burguesia resultará em uma revolução socialista, destruindo o capitalismo e construindo uma nova sociedade, onde o proletariado se tornará a classe dominante, socializando os meios de produção e assim abrindo caminho para a construção de uma sociedade sem classes, onde o Estado se torna desnecessário e desaparece. Dessa forma chegaria ao fim a exploração do homem pelo homem. Essa nova sociedade surgida após a revolução, será o socialismo, fase intermediária que resultará na sociedade sem classes, ou seja, a sociedade comunista.

O revolucionário marxista Vladimir Lênin defendia a realização da revolução socialista em países capitalistas atrasados, como era o caso da Rússia semi-feudal dos czares, desenvolvendo o conceito do partido revolucionário como vanguarda do proletariado, fundando o bolchevismo. O pensamento marxista clássico afirmava que a revolução socialista ocorreria primeiro em sociedades capitalistas desenvolvidas, como a Alemanha ou França, mas Lênin afirmava que em sua fase imperialista, o capitalismo sofreria revoluções iniciadas nos elos fracos de sua correia, que depois iriam se expandir para as sociedades desenvolvidas. Ou seja, a revolução na Rússia seria o estopim de uma revolução socialista mundial, que acabaria atingindo a Alemanha e o resto da Europa.

Em 25 de outubro de 1917(ou 7 de novembro de 1917, segundo o calendário gregoriano), os revolucionários bolcheviques derrubaram o governo provisório(que havia sido estabelecido oito meses antes, quando uma outra revolução derrubou o czarismo), realizando a revolução socialista que estabeleceu o governo soviético liderado por Vladimir Lênin. Esse governo soviético promoveu a transformação radical da sociedade russa, desapropriando a burguesia(estatizando os meios de produção nas cidades e realizando uma reforma agrária radical no campo). Baseando-se nesse modelo, outros revolucionários promoveram revoluções socialistas na Iuguslávia, China, Vietnã, Cuba, etc.

As desigualdades sociais praticamente chegaram ao fim, sendo garantido direitos e deveres iguais para homens, mulheres, e homossexuais.

"A Revolução Russa eliminou todas as leis czaristas que reprimiam a homossexualidade e que eram 'contraditórias com a consciência e a legalidade revolucionária'. Em 1923, um renomado médico de Moscou aprovava um novo código legal dizendo: 'A legislação soviética se baseia no seguinte principio: declara uma total ausência de interferência do estado e da sociedade nos assuntos sexuais, sempre e quando não sejam afetados os interesses de nenhuma outra pessoa'”. (Andrea D`Atri; em "O socialismo e a questão homossexual")

Mas infelizmente o socialismo soviético acabou sofrendo uma grave degeneração, logo após a morte de Lênin. O secretário geral do Partido Comunista, Josef Stalin, derrotou seus adversários na burocracia do partido e assumiu o poder absoluto no final dos anos 20, estabelecendo uma ditadura totalitaria responsável pela morte de cerca de 20 milhões de soviéticos. Esse regime arbitrário e burocrático, longe de acabar com a exploração do homem pelo homem, resultou no surgimento de uma casta privilegiada de burocratas que agia como uma nova classe dominante, oprimindo o proletariado e o campesinato. E pasmém, os homossexuais passaram a ser perseguidos, considerados como "pervertidos pequeno-burgueses". Isso acabou resultando no colapso do regime socialista no final dos anos 80.

"O stalinismo foi a maior tragédia do povo russo e de todo o povo do Leste Europeu, afora as guerras. Não podemos mais ter receio de afirmar isso. Havia um temor de que isso parecesse diminuir o mérito da resistência do povo soviético ao nazismo. Não diminui. Os vestígios de stalinismo, indícios que sejam, são nefastos, atentados a qualquer idéia de vida democrática." (Emiliano José; O stalinismo e sua trágica herança)

Josef Stalin era um revolucionário bolchevique, que chegou ao posto de secretário geral do Partido Comunista Russo(bolchevique) em fevereiro de 1922. Após a morte de Lênin, ocorrida em 21 de janeiro de 1924, ocorreu uma disputa feroz na burocracia do partido para se chegar a um sucessor. Por comandar a estrutura burocratica do partido, Stalin saiu na frente e acabou derrotando todos os seus adversários, assumindo o poder absoluto em 1928. E as políticas que promoveu a partir dai, descaracterizaram o socialismo.

"Mas, já em 1929, (...) Stalin passa a implementar medidas de coletivização forçada da agricultura, apoiadas numa duríssima repressão contra os camponeses. Sabe-se hoje que essa política voluntarista e duramente coercitiva - que o próprio Stalin chamou de "revolução pelo alto" - levou à morte cerca de 10 milhões de camponeses. Por outro lado, a industrialização acelerada promovida pelos famosos planos qüinqüenais, embora tenha tido importantes resultados quantitativos, produziu fome e gerou opressão sobre os trabalhadores urbanos. Conheceu-se assim, na URSS dos anos 30, um período de intensa superexploração da força de trabalho, tanto camponesa quanto operária. Tudo isso levou à construção de um regime de terror na União Soviética: consenso e hegemonia, que ainda tinham alguma presença na sociedade soviética dos anos 20, cederam definitivamente lugar à coerção e ao despotismo." (Carlos Nelson Coutinho; em "Atualidade de Gramsci")

 
A esquerda socialista precisa romper com toda tradição oriunda do stalinismo, buscando resgatar o melhor do pensamento marxista no processo de refundação do socialismo, segundo a realidade da luta de classes no século XXI. E o caminho para essa refundação, eu acredito estar presente no pensamento do marxista italiano Antonio Gramsci.

Nas atuais sociedades capitalistas ocorreu a chamada "socialização da política", que ampliou o poder político(que antes era limitado aos palácios) para a chamada "sociedade civil". Portanto não basta palavras de ordem "radicais" contra o capitalismo, muito menos a convocação de greves e manifestações. Para se desencadear um processo revolucionário, precisa-se antes disputar a hegemonia na sociedade, como Antonio Gramsci teorizou.

E mais, Gramsci foi o primeiro teórico marxista a estudar a questão do consenso, formulando assim as bases para um socialismo com democracia, corrigindo os erros que possibilitaram o surgimento do stalinismo.


"Distinguindo-se dos social-democratas que se opuseram à revolução bolchevique e à União Soviética (Kautsky, Bernstein e tantos outros), Gramsci - tal como Rosa Luxemburg -- defende a necessidade da revolução e se solidariza, ainda que criticamente, com seus primeiros passos. Mas, ao mesmo tempo, dissocia-se claramente dos rumos que a União Soviética começou a tomar a partir dos anos 30, quando a estatolatria se tornou "fanatismo teórico" e converteu-se em algo "perpétuo", consolidando assim um "governo dos funcionários" que, ao reprimir a sociedade civil e as possibilidades do autogoverno democrático dos cidadãos, gerou um despotismo burocrático que nada tinha a ver com os ideais emancipadores e libertários do socialismo marxista. (...)

Gramsci nos propõe um outro modelo de socialismo, um modelo no qual o centro da nova ordem deve residir não no fortalecimento do Estado, mas sim na ampliação da "sociedade civil", de um espaço público não estatal. Na "sociedade regulada" - o belo pseudônimo que encontrou para designar o comunismo --, Gramsci supõe (e volto a citá-lo) que "o elemento Estado-coerção pode ser imaginado como capaz de se ir exaurindo à medida que se afirmam elementos cada vez mais numerosos de sociedade regulada (ou Estado-ético, ou sociedade civil)". Ora, como se sabe, as instituições próprias da sociedade civil são o que Gramsci chama de "aparelhos ''privados'' de hegemonia", aos quais se adere consensualmente; e é precisamente essa adesão consensual o que os distingue dos aparelhos estatais, do "governo dos funcionários", que impõem suas decisões coercitivamente, de cima para baixo. Portanto, afirmar "elementos cada vez mais numerosos" de sociedade civil significa ampliar progressivamente o âmbito de atuação do consenso, ou seja, de uma esfera pública intersubjetivamente construída, fazendo assim com que as interações sociais percam cada vez mais seu caráter coercitivo."

(Carlos Nelson Coutinho; em "Atualidade de Gramsci")

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